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RACIOCÍNIO CLÍNICO EM OSTEOPATITA



Este exemplo serviu como um caso clínico feito em 2021 durante o Curso de Osteopatia dado pela Escola Superior de Saúde Cruz Vermelha Portuguesa.


Caso Clínico Nº 6:

Mulher de 37 anos, apresenta-se na consulta com queixas na região do glúteo direito. Considerei este caso pertinente por ser um caso clínico comum e por já me ter deparado com este exemplo em consulta.


ANAMNESE


Dados pessoais:

Data: 22 de Novembro de 2021. Nome: Joana Pereira Gonçalves.

Data de Nascimento: 7 de Janeiro 1984 – 37 anos.

Estado civil: solteira

Profissão: Secretária de administração. Contacto: 91-------

Morada: -------------------.

Número Contribuinte: ------------. Peso e altura: 70kg, 1,70 altura.


Historial clínico:

Paciente caucasiana, com 37 anos, secretária de administração num escritório de advocacia, dirigiu-se à consulta para reportar uma dor na região do glúteo direito. Apresenta-se com uma ligeira posição antiálgica e espasmo protetor ao apoiar o pé direito no chão.

Refere que esta dor começou a surgir à cerca de um mês sem razão aparente e que por vezes se mantém constante por períodos de algumas horas com mais ou menos intensidade. Indica também que quando permanece muitas horas sentada sente mais dores, no entanto nunca foi ao medico ver esta queixa nem nunca fez qualquer tipo de exame complementar. Não experienciou episódios semelhantes anteriormente.

Questionei se nesse período sofreu algum impacto, queda ou traumatismo. A paciente indica que apenas se recorda que sofreu um entorse à cerca de 3 meses. O entorse foi sem reflexo mio-tático.A paciente na altura fez uma ressonância magnética ao pé e tornozelo e não encontraram nenhuma patologia nem rupturas ligamentares.

Não sente tanta dor durante a noite nem de manhã mas mais no final do dia depois de sair do trabalho e reporta uma dor com intensidade 6 a 7 na escala EVA.Paciente refere não ter doenças crónicas nem ter feito nenhuma cirurgia. Não faz qualquer tipo de medicação.

Aparenta ser saudável e costuma ir ao médico 2 vezes por ano, não tem dificuldades em dormir e refere ter uma alimentação saudável. Bebe um a dois cafés por dia e não fuma.

Faz algum exercício mas não muito, natação uma vez por semana e corre de vez em quando embora nos últimos tempos não tem corrido devido à dor referida. Refere não ter problemas cardiovasculares.Sem indicação de alergias. Sem indícios de gravidez.

Menstruação regular. Refere não ter nenhuma neoplasia (cancro) nem nenhum caso de neoplasia na família.


Historial social e familiar:

Vive sozinha com um gato num 3o andar sem elevador.

Bom status socio económico.

Não tem filhos.

Divorciada.

Boa relação familiar.

Tem a espectativa de voltar a correr e não estar constantemente a combater a dor ou a ter receio de ter dor.



HIPÓTESES DE DIAGNÓSTICO


1ª hipótese – Hérnia discal lombar:

Origina-se no segmento entre dois corpos vertebrais por compressão mecânica de duas vértebras sobre o disco intervertebral causando uma procidência ou prolapso do disco contra as raízes nervosas. A hérnia ocorre geralmente póstero- lateralmente embora também possa ser póstero medial. Neste caso a hipótese de diagnóstico seria para uma possível discopatia postero lateral.

As protrusões do disco lombar em segmentos inferiores, nos estágios iniciais, podem irradiar dor para a região das nádegas.


2ª hipótese – Síndrome Piramidal:

O síndrome piramidal é um problema que afeta a via piramidal, via nervosa que controla os movimentos voluntários. É caracterizado por uma inflamação que resulta numa compressão ou irritação do nervo ciático por tensão do músculo piramidal da pélvis.

Normalmente é caracterizada como uma dor intensa na região glútea, especialmente nos locais de inserção do músculo piriforme e poderá irradiar pela parte posterior da perna.


3ª hipótese – Sacroileíte:

É um distúrbio caracterizado por uma lesão inflamatória nas articulações sacroilíacas, podendo ser unilateral ou bilateral.


4ª hipótese – Ilíaco posterior do lado direito causado por lesão de uma cadeia mecânica ascendente devido ao entorse do pé.



TESTES NEUROLÓGICOS


Exame Objetivo:


Teste de Milgram:

O paciente deitado em decúbito dorsal, elevamos ambos os membros inferiores (cerca de 10 centímetros acima da marquesa) e pedimos para manter esta posição durante uns 30 segundos. Ao fazer este teste o paciente irá aumentar a pressão intratecal, agravando eventuais lesões e sintomas radiculares. Se o paciente não conseguir manter esta posição e sentir dor é um indicativo de patologias compressivas na região lombar.


Teste Valsalva:

Com o paciente sentado, solicitamos que expire profundamente, segure a respiração e faça força como quando se está na casa de banho provocando um aumento da pressão intratecal. Este teste vai indicar uma eventual protusão discal.

O resultado de ambos os testes foi negativo, a primeira hipótese de diagnostico foi eliminada.


Teste Freiberg:

Com o paciente deitado em decúbito prono, fletimos o joelho a 90o e realizamos uma rotação interna da anca, se o paciente sentir dor o teste será considerado positivo. Este teste poderá ser reforçado pedindo ao paciente para contra resistir com uma rotação externa.


Teste de Lasègue:

Com a paciente deitada em supino, trazemos a perna a cerca de 70o segurando o calcanhar com uma das mãos e outra mão acima do joelho. Quando o paciente sentir dor baixamos ligeiramente a perna e fazemos uma dorsi flexão do pé com o intuito de estirar o nervo ciático e produzir uma ciatalgia. Este teste serve para produzir uma dor ciática e será positivo quando o paciente referir dor no dermátomo correspondente. No caso de encurtamento muscular, o paciente irá referir dor somente na musculatura posterior da coxa.

A paciente não referiu nenhuma dor ou desconforto na realização deste teste. A segunda hipótese de diagnóstico foi eliminada.


Teste Patrick / Faber:

Com o paciente deitado em decúbito dorsal, dobramos a perna do lado que irá ser testado com uma abdução e rotação externa e colocamos o pé ligeiramente acima do joelho da perna oposta. Colocamos uma mão sobre o joelho fletido e a outra fixa a espinha ilíaca antero superior do lado oposto. Fazemos uma ligeira pressão com a mão que se encontra sobre o joelho fixando a EIAS do lado oposto, se o paciente sentir uma dor na região sacro ilíaca do lado a ser testado será indício de uma inflamação sacro ilíaca. Este teste também é utilizado para detetar problemas ao nível da articulação coxo femoral e quando o resultado é positivo a dor foi sentida na região inguinal do lado a ser testado.


Teste compressão e separação SI:

Compressão: paciente em supino, colocamos as mãos lateralmente nos ilíacos e aplicamos uma pressão no sentido medial. Também poderá ser efetuado com o paciente deitado lateralmente e aplicamos uma pressão com ambas as mãos sobrepostas sobre a parte superior do ilíaco em direção à marquesa. Se o teste for positivo e o paciente sentir dor, poderá ser de uma disfunção SI, instabilidade ou inflamação.

Separação: com o paciente deitado em supino, colocamos as mãos bilateralmente sobre as EIAS com os braços cruzado e fazemos uma pressão no sentido lateral. Se o teste for positivo e o paciente sentir dor, poderá ser de uma disfunção SI, stress ligamentar SI anterior.


Teste de cisalhamento da Articulação sacro ilíaca – Squish test:


O resultado dos testes foi negativo, a terceira hipótese de diagnostico foi eliminada.


Teste de Downing:

Serve para verificar a rotação anterior e posterior dos ilíacos e determinar se algum dos ilíacos está bloqueado em posterior ou anterior. Consiste em duas partes: teste de alongamento e teste de encurtamento.Para efetuar o teste deitamos o paciente em decúbito dorsal e dobramos as pernas do paciente pedindo que eleve a cintura pélvica e volte a descer para normalizar os ilíacos. Será feita uma marca abaixo dos maléolos tibiais de forma a servir de referência para este teste. Em seguida o terapeuta segura a perna a ser testada e efetua uma flexão, abdução e rotação interna fazendo com que a perna fique mais curta. Na segunda etapa o terapeuta segura a perna a ser testada e efetua uma flexão, adução e rotação externa fazendo com que a perna fique mais longa.

Neste teste verificámos que o ilíaco esquerdo se encontra normalizado mas do lado do ilíaco direito, a perna encurta bem mas alonga muito pouco sendo considerada a quarta hipótese de diagnóstico positiva com uma lesão de ilíaco posterior de grau 1.


Teste de mola:

Com o paciente deitado em decúbito prono, fazer uma compressão com ambas as mão sobrepostas sobre uma das espinhas ilíacas postero superiores.Se um dos lados não ressaltar nem mover e estiver estagnado, indica um bloqueio no sacro e ilíaco desse mesmo lado.


Teste de mobilidade nas EIPS:

Com o paciente em bipedestação, colocamos os polegares sobre as EIPS e pedimos para o paciente fazer uma flexão anterior do tronco, do lado em que o ilíaco estiver posterior não arrasta.

O resultado dos testes foi positivo, reforçando a quarta hipótese de diagnostico.


Testes de mobilidade articular:

Foi testado a mobilidade articular do par cuboide escafoide, astrágalo, perónio e tíbia e revelou-se que estas articulações se encontram com uma disfunção somática e geram uma cadeia mecânica ascendente.


Diagnóstico:

A paciente apresenta uma lesão primária com elevação do par cuboide escafoide devido a um entorse em supinação do pé de grau 1 sem reflexo mio tático.Esta disfunção por consequência provocou um astrágalo anterior com rotação externa. Encurtamento dos músculos peronial lateral longo e tibial posterior. Uma rotação externa e elevação da cabeça peronial proximal e rotação externa da tíbia através da membrana interóssea. Encurtamento dos isquiotibiais em particular o bíceps femoral. Em consequência, esta cadeia mecânica ascendente traumática criou uma lesão secundária de um ilíaco posterior do lado direito tensionando os ligamentos iliolombares desse mesmo lado, o que gerou a sintomatologia que a senhora Joana Gonçalves refere.


PLANO DE TRATAMENTO


Quiromassagem e técnicas de libertação mio-fascial:

Soltar as tensões e encurtamentos necessários para facilitar as normalizações articulares nomeadamente nos músculos indicados no diagnóstico, tibial posterior, peronial lateral longo e bíceps femoral. Também soltar toda a musculatura em redor e dentro da cintura pélvica, principalmente os pelvitrocantéricos, o glúteo máximo e médio, o psoas ilíaco e também a cadeia mio fascial superficial posterior até à cintura pélvica, aponeurose plantar, gastrocnémios e isquiotibiais.


Técnica de Jones sobre a musculatura posterior da perna:

Com o paciente deitado em decúbito prono, pressiono o dedo num ponto doloroso do ventre muscular trazendo o músculo a tratar ao ponto de relaxamento e peço ao paciente que inspire lento e profundo durante cerca de 60 a 90 segundos. Deixo de fazer pressão sobre o musculo que estou a tratar e lentamente volto a trazer o músculo ao ponto neutro.


Técnica somática de reprogramação neuro muscular:

Trazer o músculo a ser trabalhado passivamente até à inserção. Em seguida iniciamos um trabalho mio-tensivo com o paciente pedindo para o paciente manter o músculo em contração em quanto o terapeuta faz uma força contra resistida no sentido oposto abrindo o músculo em várias etapas. No final do máximo estiramento, pedimos para o paciente contra resistir uma última vez e soltamos o músculo criando um efeito de “recoil”. Após isso voltamos a trazer o músculo passivamente até à inserção e em seguida até à máxima extensão.


Manipulação direta de pressão sobre o par cuboide escafoide:

Paciente deitado em decúbito supino com a perna a ser tratada fletida sobre a marquesa. Com ambas as mão sobrepostas e apoiadas sobre o par cuboide escafoide, fazer uma ligeira pressão sobre a articulação, colocar em tensão e fazer uma pressão direta “thrust”.


Técnica de decoaptação do astrágalo:

Com o paciente em supino segurar firmemente o pé com ambas as mão, fazer um ligeira flexão dorsal e pronação do pé do paciente. Fazer uma ligeira tração em tensão e dar um puxão “thrust” no sentido caudal.


Técnica de manipulação do perónio:

Com o paciente deitado em supino, fletir a perna do lado a ser tratado e colocamos a mão com a articulação metacarpo falângica do indicador por detrás da cabeça do perónio e empurramos a perna para flexão trazendo a cabeça do perónio para anterior.


Técnica de manipulação miotensiva da tíbia:


Técnica de manipulação miotensiva de ilíaco posterior em prono: Técnica de manipulação direta de ilíaco posterior em prono:



REAVALIAÇÃO E PROGNÓSTICO


Reavaliação:

Após o tratamento osteopático, o teste de Downing deu negativo assim como o teste de mola e mobilidade das EIPS. A paciente Joana Gonçalves ao colocar- se de pé e caminhar sobre a sala removeu completamente a sua posição anti álgica assim como já não sente mais dor.


Prognóstico:

Recomendei a paciente a fazer um reforço muscular no tornozelo de forma a evitar eventuais futuros entorses. Sugeri que o fizesse com um fisioterapeuta ou um personal trainer. Recomendei que voltasse gradualmente a correr mantendo- se atenta ao comportamento do pé caso possa surgir qualquer instabilidade na zona do tornozelo.



DESCRIÇÃO SUCINTA ANATOMIA E BIOMECÂNICA


Tibial posterior:

Origem: Membrana interóssea e margens adjacentes da tíbia e do perónio.

Inserção: tuberosidade do escafoide e na maioria dos ossos do tarso com exceção do astrágalo.

Ação: Supinação e adução do médio e retro pé. Participa na flexão plantar e na estabilização do tornozelo.


Peronial lateral longo:

Origem: Parte lateral do perónio e membrana interóssea.

Inserção: Passa por baixo do cubóide e insere-se na face plantar do primeiro metatarso e primeiro cuneiforme.

Ação: Flexão plantar e eversão do pé.


Isquiotibiais:

Composto por três músculos e todos com origem na tuberosidade isquiática do ilíaco.


Bíceps femoral:

Inserção: cabeça do perónio

Ação: Arrasta o fémur em extensão e faz a flexão e rotação externa do joelho.


Semitendinoso:

Inserção: Tíbia na pata de ganso.

Ação: Arrasta o fémur em extensão e faz a flexão e rotação interna do joelho.


Semimembranoso:

Inserção: Condilo medial da tíbia.

Ação: Arrasta o fémur em extensão e faz a flexão e rotação interna do joelho. Todos os isquiotibiais quando a perna é o ponto fixo, provocam uma retroversão da pélvis.


Psoas, ilíaco, quadrado lombar, glúteo máximo, médio e mínimo, pelvitrocantéricos (piramidal da pélvis, gémeo inferior e superior, obturador interno e externo, quadrado crural), tensor da fáscia lata, gastrocnémios, solear, tibial anterior, quadríceps (vasto medial, vasto intermédio, vasto lateral, reto femoral).


Osteologia:

Pé: astrágalo/tálus, calcâneo, escafoide/navicular, cuboide, cuneiformes, metatarsos e falanges. Perna: fémur, tíbia, perónio/fíbula, patela.

Cintura pélvica: Ilíacos, sacro e coxis.

Ilíaco: espinha ilíaca antero superior, antero inferior, postero superior, postero inferior, crista ilíaca, tuberosidade isquiática, forame obturador, fossa ilíaca, incisura isquiática, acetábulo. Dividido por 3 partes: ílio, ísquio, púbis.


Referências:

. Instituto de Salud Integral Kiros S.L.U. CIF num. B-06275374, 2006

. Foundations of Osteopathic Medicine: Philosophy, Science, Clinical Applications and Research - 3rd edition

. Anatomia e Fisiologia de Seeley – 10a edição, 2016

. Blandine Callais-Germain, Anatomia para o movimento.








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